Há 05 anos, mulheres negras de todas as regiões brasileiras encontraram-se em Brasília para marchar contra a violência, o racismo e pelo bem viver. Era a primeira Marcha das Mulheres Negras, que ocupava as ruas da capital federal no dia 18 de novembro de 2015 para denunciar o racismo, as desigualdades sociais e raciais, o machismo, a discriminação contra os LGBTQI+s, a violência racial e o genocídio do povo negro e reafirmar a união e força das mulheres negras para transformar a realidade. Como bem diz a carta elaborada pelas mulheres negras brasileiras, “inspiradas em sua ancestralidade, a Marcha representa o firmamento de um novo pacto civilizatório na concepção de um Bem Viver, para proporcionar a todas/os/es uma nova gestão do coletivo e do individual, da natureza, da política e da cultura”.
A Marcha/2015 foi idealizada por Nilma Bentes do Pará, assumida pela Articulação de Mulheres Negras Brasileiras – AMNB e organizada por Comitês Impulsionadores em cada estado do Brasil, num processo mobilizador realizado durante os anos de 2014 e 2015, num esforço e dedicação imensos, resultando num encontro que reuniu quase 100 mil mulheres negras em Brasília naquele ano. Num encontro de alegrias, lutas, conquistas, utopias, ousadia, afetos, desafios, diferenças, igualdades e irmandades, o marco político e organizativo para construção de um novo mundo equânime e com oportunidades para todas/es/os.
A diversidade foi uma marca presente na Marcha, cuja memória faz parte do calendário organizativo e de lutas das mulheres negras por todo o país. Em Brasília estavam mulheres de todas as idades, orientações sexuais, religiões, do campo e da cidade, quilombolas, em situação de rua, com deficiência mental ou física. Trabalhadoras domésticas, profissionais do sexo, artistas, profissionais liberais, trabalhadoras rurais, extrativistas do campo e da floresta, agricultoras, marisqueiras, pescadoras, ribeirinhas, empreendedoras, culinaristas, intelectuais, artesãs, catadoras de materiais recicláveis, estudantes, comunicadoras, ativistas, parlamentares, professoras, advogadas, todas as mulheres estavam presentes e representadas. É assim que se vem construindo a organização política das Mulheres Negras no Brasil!
A Carta da Marcha, escrita por todas estas mãos, contém reivindicações importantes para o Estado e a sociedade brasileira, reivindicações estas que fazem parte da vida cotidiana das mulheres negras que seguem firmes em busca de respeito, equidade e bem-estar: o direito à vida e à liberdade; a promoção da igualdade racial; o direito ao trabalho, ao emprego e à proteção das trabalhadoras negras em todas as atividades; direito à terra, território, moradia e o direito à cidade; justiça ambiental, defesa dos bens comuns e a não mercantilização da vida; direito a previdência pública, saúde e assistência social; direito à educação e a justiça.
A Paraíba foi um dos estados que se destacou na organização da Marcha Nacional. Cerca de 30 grupos se reuniam, periodicamente, para mobilizar as mulheres negras paraibanas rumo a Brasília. Foram reuniões, realização de feiras e brechós, debates, entre outras atividades, para conseguir recursos, e assim, garantir a presença da comitiva de ativistas negras paraibanas, que levaram para a capital federal as suas inquietações e propostas, com vistas a desconstrução da sociedade patriarcal, racista, sexista e capitalista, construindo estratégias que viabilizassem a efetivação do pacto civilizatório organizado por elas. Um dos marcos da mobilização no estado foi a realização do I Encontro Estadual das Mulheres Negras da Paraíba, que reuniu cerca de 100 mulheres negras do estado da Paraíba. As reuniões para mobilização das mulheres negras foram realizadas nas cidades de Rio Tinto, Picuí, Cabedelo, Campina Grande, Santa Rita, Alagoa Grande, entre outras. O legado que a Marcha das Mulheres Negras deixou para a Paraíba foi imenso, proporcionando o fortalecimento do Movimento de Mulheres Negras no estado e fazendo germinar a Abayomi – Coletiva de Mulheres Negras da Paraíba, em 2016. Segundo a professora Vânia Fonseca, integrante da Bamidelê – Organização de Mulheres Negras na Paraíba, o legado deixado por este momento histórico de irmandade é que é preciso derrubar o patriarcado, o machismo, o racismo e o capitalismo, promovendo mudanças reais na estrutura da sociedade brasileira.
As mulheres negras seguem em marcha, resistindo e atuando para consolidação de uma sociedade sem racismo, sem fascismo, sem sexismo. O surgimento de governos autoritários em diversas partes do mundo, e que atacam direitos arduamente conquistados e o Estado Democrático de Direito só fez reafirmar que a luta não pode parar um só minuto. O racismo estrutural, que gera violência e desigualdades para a população negra e provoca prejuízos para toda a sociedade, precisa ser destruído. E em 2020, mesmo diante de uma pandemia que já ceifou mais de 160 mil vidas no Brasil, é preciso ocupar todos os espaços, reafirmando os direitos humanos, a liberdade de expressão e a equidade racial.
No dia 20 de Novembro, celebra-se o Dia da Consciência Negra em todo o Brasil. A data é uma referência ao líder negro Zumbi, que organizou o Quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga, no estado de Alagoas, em 1968. A data foi instituída após questionamentos do movimento negro sobre a legitimidade do 13 de maio data oficial da “Abolição da Escravatura”, mas que esta não representou a liberdade, emancipação e uma vida digna para a população negra. A partir dessas discussões, o movimento trouxe à tona a memória de Zumbi e sua luta histórica, que tinha uma ação legítima e real da organização de negras e negros contra a escravidão e outras formas de exploração. O 20 de novembro é uma data de resistência, luta e mobilização. Ao passo em que a memória de Zumbi era resgatada, as mulheres negras resgataram a história de Dandara, outra líder do Quilombo dos Palmares, que lutou bravamente na resistência do local sagrado de seu povo.
A Marcha das Mulheres Negras aconteceu dois dias antes do Dia da Consciência Negra e representa o fortalecimento e mobilização das mulheres negras para a proposição de um novo mundo. Em 2020, as mulheres negras congregam-se novamente em suas regiões, reafirmando o compromisso de construção de um mundo de todas/es/os e para todas/es/os e fazendo a memória da Marcha/2015, com diversas atividades.
Na Paraíba, para marcar a data, será realizado o II Festival Afro Feminista, com o apoio da CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviços, trazendo reflexões e ações para dar visibilidade a participação de negras e negros na construção da sociedade brasileira. O Festival tem como objetivo mostrar os efeitos das discriminações de raça e gênero neste contexto de pandemia, evidenciando as narrativas subversivas negras de memória da marcha e de denúncia do racismo, contendo três grandes ações: 17/11 – “Gira de Escrevivências: 05 anos da Marcha das mulheres Negras – desafios e potenciais para as mulheres negras na Paraíba”; dia 21, o Xirê das Pretas (Live-Show) e no dia 22, a Feira Preta. Além disso, as diversas organizações/grupos que compõem o Movimento de Mulheres Negras na Paraíba desenvolverão diversas ações condensadas na Agenda Afro-Feminista – Novembro Negro – Marcha das Mulheres Negras + 5!
Mabel Dias – Assessoria de Comunicação da Abayomi/PB