Por Elizabeth Souza
Na ocasião, a Rede celebrou os 10 anos de história e projetou os próximos anos da luta das mulheres negras da região.
“Mulher negra é poder”. Foi essa uma das principais premissas que deu impulso para o surgimento da Rede de Mulheres Negras do Nordeste (RMNN), há 10 anos atrás. Hoje, essa continua sendo a certeza que, permeada por uma lógica coletiva, tem alicerçado a articulação, que comemorou sua primeira década de luta e (r)existência em um encontro potente que reuniu organizações dos nove estados nordestinos, dos dias 27 a 30 de julho, em Aracaju (SE).
Os quatro dias de encontro foram recheados por acolhidas, debates, apresentações artísticas, autocuidado, afetos, marcados por uma contagiante comunhão de gerações. Na noite de quinta-feira (27), abrindo os caminhos do que seriam aqueles dias de celebração e entrega, Mãe Sônia do Ilê Asè Ojú Ifá Ni Sahara realizou uma cerimônia de saudação entre as mulheres. Em seguida, a “Afrochegança” marcou o momento de acolhida e apresentação das organizações presentes e seus respectivos estados.
A sexta-feira (28) iniciou com um momento de autocuidado comandado pela Abayomi – Coletiva de Mulheres Negras na Paraíba, reforçando a importância da saúde física, mental e espiritual. Logo depois, a Mesa “10 anos da Rede de Mulheres Negras do Nordeste – Esperançando nas lutas de Mulheres Negras do Nordeste” abriu espaço para o debate sobre a trajetória da articulação nessa primeira década de história. A importância da coletividade foi um dos principais pontos destacados.
“Mulher negra é poder, mas esse deve ser um poder coletivo” comentou Halda Regina, da Ayabás – Instituto da Mulher Negra do Piauí, uma das integrantes a compor a mesa, assim como Valdecir Nascimento, do Odara – Instituto da Mulher Negra. Ambas as organizações são cofundadoras e compõem a atual coordenação da Rede, junto com a Abayomi.
“A Rede não precisa de um monte de filiadas. A Rede precisa de um monte de mulheres comprometidas”, enfatizou Val, que junto com suas companheiras de mesa, Terlúcia Silva (Abayomi – PB), Josanira Luz (Mãe Andresa – MA), Halda Regina e Rosana Fernandes (da Coordenadoria Ecumênica de Serviços), foram homenageadas pelo grupo de adolescentes Ayomide Odara, que também marcaram presença no encontro.
“Tenho a sensação de dever cumprido, fiz o dever correto”, auto-analisou Valdecir, comentando sua trajetória junto à Rede, bem como destacou o objetivo que tem sido reforçado durante esses anos. “Formar mulheres políticas para fazer incidência política”, caminho que ela considera necessário para que mulheres negras tenham, de fato, acesso ao poder.
Ainda na sexta-feira, ocorreu mais um momento de autocuidado, dessa vez orientado pelo Grupo de Mulheres Negras Mãe Andresa (MA), seguida da mesa “Análise de Conjuntura na Perspectiva das Mulheres Negras Jovens”.
Uma das integrantes da mesa e também anfitriã do Encontro, Laila Oliveira, da Auto-organização de Mulheres Negras Rejane Maria (SE), em entrevista à equipe de comunicação da RMNN, comentou sobre a alegria da celebração dos 10 anos da Rede em sua terra natal.
“É muito simbólico para todas nós os 10 anos da Rede de Mulheres Negras do Nordeste acontecer aqui em Aracaju, porque marca um momento em que nós, mulheres negras sergipanas, compreendemos a importância de caminharmos juntas, nos organizando coletivamente”, disse Laila.
Uma apresentação artística da Trupe de Mulheres Esperança Garcia, do Piauí, encerrou os trabalhos da sexta-feira, 28. No último dia de programação (29), os caminhos foram abertos com a “Oficina Projetando Futuro: organização da Rede de Mulheres Negras do Nordeste – O que queremos para a Região Nordeste e para a luta das mulheres negras no Nordeste nos próximos 10 anos”, que teve a facilitação de Naiara Leite, integrante do Odara. A performance realizada pela bailarina e fundadora do Coletivo de Dança Gincá, Cleanis Silva, foi outro momento emocionante do Encontro. A dançarina também recebeu homenagens pela sua trajetória na busca pelos direitos das mulheres negras no mundo da dança.
Encerrando com chave de ouro
O encerramento do Encontro foi realizado no Espaço Ilê Dendê, na capital sergipana, onde ocorreu o ponto alto da celebração pelos 10 anos da Rede de Mulheres Negras do Nordeste, com direito a bolo e parabéns. O momento foi marcado por muita música, dança e envolvimento com os shows das cantoras sergipanas Lari Lima e Anne Carol, embaladas por muita MPB – Música Preta Brasileira. Ainda contamos com a performance de Natasha Wonderfull, que interpretou a rainha Elza Soares.
“Eu me senti mais forte quando vi várias mulheres negras juntas, cada uma com seu jeito, de mãos dadas Me senti livre, e esse é um sonho de todas nós”. disse Natasha, que é integrante do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros – FONATRANS.
Mais fortes e com o coração preenchido de afeto e aprendizados. Era isso o que se ouvia entre os corredores do hotel que hospedou cerca de 100 mulheres das mais de 35 organizações que, atualmente, integram a Rede de Mulheres Negras do Nordeste. Companheiras que constroem estratégias de luta e emancipação para muitas outras mulheres negras e comunidades dos mais diversos territórios da região Nordeste e do Brasil. “Não podemos apenas ser Rede na celebração, é preciso compromisso”, como bem nos alertou Terlúcia Silva durante uma de suas falas.
A caminhada é árdua e demanda radicalidade, são esses ensinamentos negritados durante o Encontro, e é no coletivo que encontramos sentido e força para seguir.
Que venham os próximos 10 anos!!!